O Congresso Nacional aprovou, na última quinta-feira (10), o projeto de lei complementar que modifica a cobrança do ICMS nos estados. Isso no mesmo dia em que foi promovido um reajuste histórico pela Petrobras (PETR3;PETR4), de cerca de 19% para a gasolina e de 25% para o diesel, que pegou deputados e senadores de surpresa e provocou uma mobilização de última hora em ambas as Casas Legislativas.
O Bradesco BBI destacou resumidamente no que consistem esses projetos, que seguem abaixo:
(1) O projeto de lei 11/2020 irá (a) unificar o ICMS dos combustíveis na mesma alíquota nacional, o que é visto como positivo para Vibra ([ativo=VIBBR3]), Raizen (RAIZ4) e Ultrapar (UGPA3), pois deve coibir a evasão fiscal de players menores, destaca o BBI; (b) remover permanentemente os impostos PIS/COFINS sobre o diesel (cerca de R$ 0,33/litro) e (c) tanto para gasolina quanto para diesel, mudará o cálculo do ICMS para uma base média móvel de 5 anos sobre os preços dos combustíveis.
Como resultado, após a sanção dos projetos de lei, os analistas estimam que o impacto na bomba dos aumentos de preços da Petrobras na véspera deve ser limitado a uma alta de 6% para gasolina e de 5% para o diesel.
(2) O projeto de lei 1.472/2021 cria um fundo de estabilização de combustível. Dentro de uma certa faixa de preços do petróleo, produtores e importadores poderão precificar seu combustível livremente. Quando a paridade de preços estiver acima de um determinado teto, a diferença será subsidiada pelo fundo em favor dos produtores e importadores de combustíveis. Quando a paridade estiver abaixo de um piso, produtores e importadores pagarão a diferença ao fundo.
O fundo será capitalizado principalmente com: (i) impostos sobre o petróleo (royalties + participação especial), (ii) dividendos pagos da Petrobras ao governo federal (excedendo o que está no orçamento anual, que os analistas estimam em R$ 18 bilhões), e (iii) receitas petrolíferas não recorrentes, tais como receitas de leilões de petróleo. Os recursos do leilão de petróleo Atapu e Sepia em dezembro de 2021 (R$ 11 bilhões) também serão destinados ao fundo de estabilização de combustível.
Mudança no ICMS para sanção, fundo ainda a ser analisado pela Câmara
A mudança na cobrança do ICMS agora segue para sanção presidencial, uma vez que passou pelo Senado e pela Câmara. Segundo o ministério da Economia, a medida deve atenuar em cerca de 60 centavos a alta do diesel. No caso da gasolina, os impactos ainda não foram anunciados, mas eles devem ser menores na medida em que não foi autorizado, no texto final, qualquer tipo de subsídio federal.
Já com relação ao projeto envolvendo o fundo de estabilização, ele chegou a ser aprovado no Senado Federal. Contudo, a Câmara entendeu que o texto ainda deve passar por maior amadurecimento, deixando-o para uma discussão futura.
“Logicamente, o senso de urgência no Congresso foi provocado pelo aumento anunciado pela gigante petroleira – e com anuência do governo, que havia indicado não ser possível segurar o aumento”, destaca a Levante Ideias de Investimentos.
Conforme aponta a Levante, a aprovação da cobrança monofásica do ICMS, possibilitando algum alívio nas bombas de combustíveis, é apenas a primeira medida promovida pelo Congresso e governo a fim de apaziguar os efeitos negativos da alta nos preços.
No mesmo sentido, o ministério da Economia conseguiu evitar que o segundo projeto – sobre o fundo de estabilização e eventuais mudanças na política de preços da estatal – fosse aprovado a toque de caixa pelos parlamentares, destaca a casa de research.
O governo resiste a ideias que possam induzir reinterpretações sobre a política de preços da estatal, apostando em programa de subsídios somente na hipótese da guerra entre Rússia e Ucrânia se prolongar.
“A pressão por novas medidas, no entanto, segue bastante forte no Congresso e deve gerar reações do Planalto ainda nas próximas semanas. Devido à conjuntura excepcional (e à sinalização de que a política de preços da Petrobras segue pelo menos parcialmente em voga), o mercado não tem penalizado medidas que combatam a forte alta nos preços”, avalia a Levante. Ontem, no dia do anúncio de elevação dos preços pela Petrobras, as ações tiveram expressivos ganhos, com alta de 2,8% para PETR3 e de 3,5% para PETR4, ainda que analistas passassem a destacar também possíveis intervenções estatais mais à frente com as medidas.
Lei 1.472: saída construtiva, com alguns riscos no radar
Sobre o projeto de lei 1.472, que cria o fundo de estabilização dos combustíveis, os analistas do Bradesco BBI destacam que, de todas as soluções que estavam sendo consideradas, veem como uma saída construtiva para os altos preços dos combustíveis no Brasil, e uma solução que já é utilizada em outros países da América Latina, como Chile e Colômbia,
já tendo sido utilizada no Brasil no passado (Conta Petróleo).
“Mais importante ainda, alinha o interesse dos consumidores (preços mais baratos do combustível) com os acionistas minoritários. Para se proteger de possíveis interferências e contribuir para a redução dos preços dos combustíveis, a
Petrobras terá o incentivo para maximizar o pagamento de dividendos sob sua política responsável aprovada pelo conselho (que respeita as metas de alavancagem)”, apontam.
Por outro lado, destacam um risco da lei 1.472, apesar de gostarem do projeto. “A definição de paridade do Artigo 68-F era muito ampla. Acreditamos que o cálculo da paridade passará a ser de responsabilidade do regulador (ANP). Sob este governo, acreditamos que o cálculo não deve resultar em qualquer atividade de dumping que afaste a concorrência de importação”, avalia o BBI.
Mas isso pode se tornar um risco no futuro uma vez que o artigo 5º também menciona que, extraordinariamente, o lucro líquido da Petrobras em 2022 deverá ter destinação adicional ao fundo de estabilização, o que traz algum risco para o pagamento de dividendos neste ano.
No entanto, o relator do projeto, Jean Paul Prates (PT) disse que o artigo não visa interferir nos direitos dos acionistas minoritários. “De qualquer forma, se este artigo específico for aprovado, a administração e o conselho da Petrobras precisarão agir para evitar que qualquer possível governança seja violada”, complementam os analistas do banco.
Cabe ressaltar que, em uma versão anterior do parecer, o senador Jean Paul Prates havia proposto a criação de um imposto de exportação incidente sobre o petróleo bruto, para também abastecer a conta. Controversa, a medida foi retirada, o que também gerou certo alívio. Conrado Ramos José, head de research da Somma investimentos, havia destacado ao InfoMoney que essa medida aumentaria a incerteza em torna da empresa em um cenário em que a estatal passou a exportar mais com a venda de suas refinarias, além do impacto em desestímulos a alguns investimentos, principalmente estrangeiros. Já sobre o ICMS, o impacto é mais fiscal do que na companhia em si, aponta.
O Bradesco BBI aponta que, conforme mencionado, considera as soluções fornecidas por ambos os projetos de lei como construtivas, visando proteger a governança da Petrobras e o interesse dos consumidores em tempos difíceis de volatilidade das commodities.
“Esperamos que o fundo se torne uma solução estrutural em muitos governos à frente. Acreditamos que o sucesso do fundo dependerá dos valores capitalizados nele: quanto mais, melhor, pois será capaz de absorver qualquer grande avanço na
commodity ou choques cambiais que possam surgir no futuro. O regulador e autoridade antitruste brasileira Cade também desempenharão um papel fundamental no cálculo da paridade no futuro”, apontam os analistas.
Quaisquer mudanças materiais no cálculo em relação a hoje podem prejudicar os direitos dos acionistas minoritários da Petrobras e trazer desequilíbrios à concorrência de mercado, eliminando as importações por meio de dumping doméstico, avaliam. No entanto, se o fundo estiver cumprindo bem seu propósito, não deve haver incentivo para se intrometer na paridade de importação, destaca.
Os analistas do BBI seguem com recomendação outperform (desempenho acima da média do mercado), com preço-alvo de R$ 42, o que configura um potencial de valorização de 25% em relação ao fechamento da véspera.
Fonte: Infomoney